Introdução: a síndrome de Turner (ST) é uma doença genética caracterizada pela monossomia completa ou parcial do cromossomo X com incidência estimada entre 1:1800 a 1:5000 recém-nascidos do sexo feminino. Os sinais clínicos incluem pescoço curto e alado, baixa implantação dos cabelos na nuca, palato alto, baixa estatura, disgenesia gonadal e tórax em escudo. Alterações congênitas renais estão presentes em até 30% das mulheres com ST; alterações cardiovasculares são comuns e podem ser divididas entre as congênitas (valva aórtica bicúspide e coarctação da aorta) e adquiridas (hipertensão arterial, doença isquêmica cardíaca e dilatação com ou sem ruptura da aorta).
Relato de caso: mulher de 34 anos com diagnóstico de ST, além de hipotireoidismo, hipertensão arterial e doença renal crônica em diálise há 2 anos, encaminhada para avaliação cardiovascular pré-transplante renal. Assintomática do ponto de vista cardiovascular. Exame físico revela pescoço alado, baixa estatura e sobrepeso. ECG de repouso com BRD e ecocardiograma mostrando função ventricular esquerda normal, sem alterações estruturais. Estudo de perfusão miocárdica (Sestamibi) revelou hipocaptação transitória em paredes anterior, ínfero-lateral e apical. A coronariografia mostrou padrão obstrutivo uniarterial com lesão de 95% no 1/3 proximal do ramo interventricular anterior (RIVA) da artéria coronária esquerda. A paciente aguarda convocação para intervenção coronária percutânea e implante de stent.
Discussão: Ainda que a presença de coronárias anômalas seja o achado mais frequente quando há envolvimento das artérias coronárias em pacientes com ST, dados epidemiológicos sugerem maior mortalidade por doença arterial coronariana (DAC) aterosclerótica em relação à população geral. A negligência no rastreamento de DAC nestes pacientes pode privá-los de medidas farmacológicas de prevenção secundária ou intervencionistas para minimizar o risco de eventos cardiovasculares. No caso aqui relatado, salientamos o fato de se tratar de paciente jovem com ST, sem outros fatores de risco além de hipertensão arterial, assintomática e sem limitação funcional e com grave obstrução do RIVA.
Conclusão: pacientes com anomalias genéticas requerem monitorização adequada e controle dos fatores de risco. É recomendado que as pacientes com ST sejam submetidas a exames cardiovasculares regulares, incluindo triagem já no diagnóstico e subsequentes avaliações. O reconhecimento de possível envolvimento cardíaco (congênito ou adquirido) em pacientes com anomalias genéticas torna-se imprescindível para o sucesso terapêutico.